O Fantástico programa jornalístico
da rede Globo exibiu na noite de ontem, domingo 15, de março, uma matéria especial
sobre o desmatamento no noroeste do estado do Maranhão, em Santa
Inês. A matéria explanada em um vídeo de pouco mais de 11 minutos retrata a
situação em que vive os indígenas daquela região, ameaçados por madeireiros, e
relata ainda a devastação da floresta amazônica.
Foto reprodução, vídeo no link abaixo: |
Alguns indígenas vivem
isolados na Floresta Amazônica e jamais tinham feito contato com o homem
branco. Agora, imagine o susto, a sensação de pavor desses índios, quando eles
perceberam a presença de madeireiros invadindo o território deles, dando tiros,
derrubando árvores. Só restou correr desesperadamente em busca de socorro.
Veja a integra da matéria:
Você sabia que
o povo mais ameaçado de extinção em todo o mundo vive no Brasil? São índios,
alguns deles vivem isolados na Floresta Amazônica e jamais tinham feito contato
com o homem branco. Agora, imagine o susto, a sensação de pavor desses índios,
quando eles perceberam a presença de madeireiros invadindo o território deles,
dando tiros, derrubando árvores. Só restou correr desesperadamente em busca de
socorro.
Ihoro conhece
todos os sons da floresta. Mas aquele barulho ele nunca tinha escutado antes.
Nem nunca tinha visto aquele tipo de pessoa. Homens brancos, invasores,
dispostos a destruir e matar. Foi preciso fugir, abandonar a sua terra para
sobreviver.
O Fantástico
foi ao noroeste do estado do Maranhão e seguiu para uma aldeia da tribo Awá.
Pela primeira vez uma equipe de televisão foi autorizada a chegar tão perto de
um índio que até alguns dias atrás nunca havia feito contato com a civilização.
Ihoro, nome que na língua tupi quer dizer "gavião real", tem cerca de
20 anos.
Uma aparência
rude, mas muita doçura no olhar. Roupas ainda causam estranhamento. Ele vivia
isolado em um pedaço da Floresta Amazônica, mas acabou encurralado por
madeireiros. Há três meses, foi resgatado por um grupo de índios caçadores e
levado para uma aldeia.
Cacique Macumã: O Ihoro contou a história assim: ‘atirou tiro de espingarda atrás de
mim’.
Fantástico: Ihoro teve medo?
Cacique: Tem medo, medo. Ihoro tem medo.
Fantástico: Ihoro teve medo?
Cacique: Tem medo, medo. Ihoro tem medo.
Namatiá passou
pela mesma situação. Há seis anos, teve que deixar a vida nômade e morar em uma
aldeia.
“Eu morava com
meus três irmãos na floresta. Nós fugimos dos forasteiros para as profundezas
da floresta”, conta Namatiá.
Os Awá estão
espalhados por quatro terras indígenas: Alto Turiaçu, Awá, Caru e Araribóia. A
mais devastada, a Awá, perdeu mais de 35% do território de 2010 a 2013.
“Sem a
natureza, sem a mata, nós também acaba”, diz o índio Awá Tiparajá.
Eles têm uma
dependência profunda da floresta. Nela caçam, colhem frutos. Sem as árvores, a
mata, passam fome. Segundo a ONG inglesa Survival International, defensora de
tribos no mundo todo, o povo Awá é o mais ameaçado de extinção do planeta.
“Primeiro porque
eles são nômades e os povos nômades são muito vulneráveis porque ninguém
realmente sabe o que está acontecendo porque eles estão bem escondidos dentro
da floresta. Então é muito fácil derrubar a floresta e até matar eles. Está
acontecendo. Também porque eles são muito poucos em número”, diz a historiadora
da ONG, Fiona Watson.
Hoje, de acordo
com a Fundação Nacional do Índio, a Funai, existem apenas 400 Awás.
“Se a gente
considerar que o Brasil é um dos últimos dos países com a presença de povos
indígenas isolados, dentro do Brasil o povo Awá-Guajá estaria no grau de alta
vulnerabilidade, ou seja, ameaçado realmente de um crime de genocídio, que está sendo perpetrado por essas atividades ilícitas, de exploração de madeira”,
destaca Carlos Travassos, coordenador geral de índios isolados da Funai.
Ameaçados e
condenados ao desaparecimento, eles gritam por socorro. E um contra-ataque foi
montado pelo Ibama e pela Funai. Durante alguns dias, nossa equipe acompanhou
uma Operação do Grupo Especial de Fiscalização do Ibama. E a equipe embarcou no
helicóptero.
Do alto
observa-se os danos, os madeireiros já não abrem grandes clareiras, apenas
derrubam as árvores que tem maior valor comercial. Assim, mesmo com as imagens
de satélite, nem sempre é possível estimar o tamanho real do desmatamento.
“Há que se endurecer as leis ambientais. Os crimes
ambientais dão no máximo quatro anos de prisão, geralmente as pessoas que são
condenadas, passam a entregar cestas básicas, a pagar serviços comunitários”,
explica o diretor de proteção ambiental do Ibama, Luciano Evaristo de Menezes.
Por uma estrada
os madeireiros escoam boa parte das toras cortadas na floresta. Por isso, a
equipe de fiscalização decidiu montar um acampamento e passar a noite para
tentar interceptar os caminhoneiros. Choveu forte a noite toda. Essa e outras
estradas viraram lamaçais. Caminhoneiros não arriscaram passar pelo local, mas
outras trilhas revelam marcas recentes de pneus e levam os agentes aos cenários
dos crimes. Máquinas, um acampamento inteiro na carroceria de um caminhão. Em
outro ponto, o acampamento foi abandonado às pressas.
As toras são transportadas num caminhão caindo aos
pedaços. Não tem placa. O veículo, segundo a equipe de fiscalização, está com o
chassi adulterado - foi roubado em algum canto do país. E dentro da cabine, a
gente vê uma curiosidade: o tanque de combustível feito totalmente no
improviso.
Até plantações de maconha foram encontradas em
terras indígenas. A estratégia é destruir tudo, inclusive grandes serrarias. No
entorno e dentro das terras Awá, o Ibama já fechou 173 delas. Esta já havia
sido alvo da fiscalização no ano passado.
“O objetivo é descapitalizar o infrator. Na verdade
são criminosos que estão roubando e receptando madeira da terra indígena e da
unidade de conservação. Eles sentem no bolso prejuízo”, diz o agente ambiental
do Ibama Roberto Cabral.
O dono do negócio, quem realmente lucra com o a
extração ilegal, se esconde. Na linha de frente, os agentes encontram apenas
pessoas vítimas de exploração e trabalho escravo.
“As populações
do entorno, as populações não indígenas são muito carentes, há uma dificuldade
de geração de renda dessas populações que acabam se envolvendo também com
atividades ilícitas”, destaca Carlos Travassos, coordenador geral de índios
isolados da Funai.
“Dessa vez,
trabalhei trinta dias de graça. Não me pagaram aqui. Queria me espancar no
barraco aqui ainda. Me bater no barraco”, diz um madeireiro.
Fantástico: Tinha muita gente trabalhando com o senhor?
Madeireiro: Tinha mais ou menos umas vinte e cinco pessoas trabalhando aqui.
Fantástico: Cada pessoa cortava, então, quantas árvores?
Madeireiro: Um máximo de 15 árvores, 15, 20 árvores.
Madeireiro: Tinha mais ou menos umas vinte e cinco pessoas trabalhando aqui.
Fantástico: Cada pessoa cortava, então, quantas árvores?
Madeireiro: Um máximo de 15 árvores, 15, 20 árvores.
Somente nesta
frente clandestina, cerca de 500 árvores foram derrubadas por dia.
“Os índios são
os primeiros defensores da floresta, quer queira, quer não, os madeireiros
temem os índios. Então devemos preservar o índio e preservar a floresta”, diz o
diretor de proteção ambiental do Ibama, Luciano Evaristo de Menezes.
"Nós
estamos aqui para lutar pela nossa mata, pela nossa floresta, que é isso que
nós vamos deixar para os nossos filhos e para os nossos netos", diz a
índia.
Não são só os
Awá que se sentem ameaçados na região. Os Guajajaras perceberam que precisam se
unir para tentar frear o desmatamento na terra indígena. Eles criaram um grupo
pequeno, formado por 24 índios. São os chamados guardiões, que vão vigiar e
fiscalizar os pontos ilegal de exploração de madeira.
“Eu já fui
ameaçado várias vezes, mas isso não vai me intimidar”, afirma o cacique Antonio
Guajajara.
Em menor
número, os Awá se mostram mais frágeis. “Os brancos mataram minha mulher e meu
filho. Eles foram mortos na floresta com uma arma feita de ferro. Eu era pai e
um dos meus filhos morreu”, conta um índio.
Mas há uma
palavra na língua branca que resume o que eles estão dispostos a fazer:
resistir.
“Desaparece
toda uma visão de mundo, toda uma história de um povo, seus conhecimentos, mas
acho que também desaparece uma parte da riqueza e da diversidade da humanidade.
Todos nós perdemos”, destaca a historiadora da ONG, Fiona Watson
Ihoro e a
família, que moravam longe da civilização, aprendem agora a viver em grupo, mas
sentem as consequências dessa aproximação. A mãe e a tia estão doentes, por
isso não pudemos chegar perto delas.
“Essa situação
de pós-contato é sempre muito complicada. Elas têm uma saúde muito frágil,
falta de imunidade. Várias doenças que pra nós são simples, então, eles
contraem uma série de resfriados diretamente. A gente diz que os dois primeiros
anos são os dois primeiros anos mais vulneráveis no que diz respeito a questão
da saúde”, diz Carlos Travassos, coordenador geral de índios isolados da Funai.
Na aldeia,
Ihoro já encontrou um amor. Uma índia mais velha ensina ao rapaz os desafios
que terá pela frente. Será que ele pensa em voltar a viver no meio da floresta?
“Acho que ainda
é cedo para dizer. A gente tem a expectativa também que ele não venha pra cá de
forma permanente, mas que ele possa optar, ter liberdade para optar o caminho
que ele assim quiser”, diz Carlos Travassos.